Comecemos pelo final. Eu moro ao longo da linha 3 de metro. A duas estações do final, sendo que o terminal do meu lado está em obras, ou seja, moro na (agora) penúltima estação. Fiz assim a linha 3 completa em duas situações distintas. Primeiro em direcção ao extremo mais longe e só mais tarde o resto que faltava para o outro lado. Mas começo pelo lado mais pequeno, desde minha casa perto da estação Palos de La Frontera até Legazpi. Basicamente, este troço da linha 3 é todo feito na minha rua, o Paseo de Delicias. Assim, saí de casa e desci a minha rua, como faço todos os dias para apanhar o comboio na estação com o mesmo nome. Passo pelos estabelecimentos que vejo todos os dias e que são já familiares, parte da rotina. São apenas dois quarteirões, com um jardim pelo meio. Passo a estação e começo passo agora para a parte desconhecida da rua onde moro.
Nota-se alguma diferença? Será impressão ou será que os prédios começam a parecer mais feios? A impressão torna-se mais forte conforme a luminosidade diminui igualmente. De facto, entramos numa zona, mais perto de Legazpi, onde as casas são diferentes, piores e onde se começa a notar que não há tantos espanhois. Assim, chegando finalmente à estação de Legazpi, estamos já completamente longe do topo do Paseo de las Delícias e os edificios monumentais que daí se vêem, como por exemplo o museu Rainha Sofia. É portanto, o lado mais curto e mais desinteressante da linha 3.
Façamos agora o percurso no sentido inverso, e saio de minha casa e sigo imediatamente pela calle Palos de La Frontera. Por aqui, tudo normal, zona de classe média e sem nada a assinalar. Chego à calle de Embajadores que dá nome à próxima estação de metro da linha e subo para a direita. A calle Embajadores é tão larga como o Paseo de Delícias e cruzam-se mais abaixo, numa
praça por onde passo a caminho de Legazpi. Tenho de subir ainda durante algum tempo e digo subir porque apesar de Madrid ser relativamente plana, quanto mais a sul se está, maior é o declive (e aqui ainda estamos a sul). Chego à Glorieta de Embajadores, em obras, as malditas obras que estão omnipresentes na cidade, fruto da ilusão de organizar os jogos olímpicos de 2012, que ocorrerá em Londres. Parece Lisboa em 1997... mas maior.
Na glorieta de Embajadores, apanho a calle Miguel Servet e entro já na mal afamada zona de Lavapiés. Quando aqui a Madrid, perguntei que zonas são perigosas. Disseram-me que nada é muito perigoso, o que me pareceu estranho, dados os cuidados que tenho quando ando em Lisboa. Reforcei a pergunta e avisaram-me com alguma reticência que as "afueras" (os subúrbios) eram perigosos, mas que no centro da cidade, talvez devido ao carácter demográfico da população apenas a zona de Lavapiés era causa de maiores cuidados. Aparentemente há uns anos era realmente perigosa, mas agora está melhor. No entanto confesso que alguns indivíduos tinham algum aspecto duvidoso. Foi igualmente aqui que vi a única evidência de crime, quando passei mais tarde por uma senhora que chorava enquanto falava com a polícia. No entanto, já passei por aqui várias vezes (inclusivé pelas 3h da manhã) e nada se passou. No entanto a primeira impressão foi muito interessante. A rua Miguel Servet está cheia de pequenos restaurantes de várias nacionalidades, que nos domingos à tarde (após "el Rastro") se enchem de pessoas que bebem copos (segundo um meu companheiro de casa directamente da noite anterior...) e convivem com os seus amigos para aproveitar o fim do fim de semana. Chegando à calle Valência, viro à esquerda, continuando a subir (o declive continua), já muito perto da plaza de Lavapiés. Aqui está a estação de metro seguinte. Agora, na direcção que pretendo tomar, existem 3 ruas que sobem na mesma direcção. Resolvo apanhar a do meio, a calle Olivar.
A diferença não teria sido muita, pois as três vão dar a pontos diferentes da calle de la Madalena, a partir da qual seria fácil seguir caminho em direcção à Puerta del Sol. Entretanto já passei por estas três ruas, tanto de dia como de noite (Lavapiés, como seria de esperar, é um óptimo local para se sair pela noite, beber copos com amigos, comer, ver espectáculos, etc.) e posso dizer que ambas estão cheias de pequenos bares, casas de chá, restaurantes e sítios que visitar com tempo ou sem, para apenas beber um copo. No meu passeio original, chego à calle Atocha e viro à esquerda, alcançando a plaza Jacinto Benavente. Mais uma vez (tal como se passou com a linha 1) passo na calle Carretas cheia de comércio e atinjo Sol.
Daqui, sigo pela calle de Preciados, esta sim, cheia de comércio, bares e animação, de tal forma que lembra uma rua Augusta (de Lisboa) condensada em 350/400 metros. Aqui está por exemplo a tentadora Fnac de 5 ou 6 andares (onde já vi "The death of a chinese bookie", o filme donde tirei o meu "misterioso" endereço de e-mail...). De resto, chegando à plaza de Callao, vemos muitos cinemas (não daqueles que eu frequento, pois aqui é só filmes dobrados) e sentimos que estamos no coração de Madrid, tendo passado há pouco por Sol e tendo ao nosso lado a Gran Via. E é pela Gran Via que descemos (sim, aqui já descemos outra vez, mas explicarei porquê noutra ocasião), passando pelos mesmos edifícios que quando visitei esta cidade pela primeira vez em 1999 fizeram com que eu tivesse imediatamente a impressão de estar numa cidade grandiosa, muito mais cidade grande, no sentido europeu da coisa. Discutia eu há alguns anos com um colega de trabalho holandês que Lisboa não lhe dava a ideia de ser uma cidade grande e de facto observando o centro de Madrid (e claro, o tamanho do resto), percebe-se porque é que ele dizia isso.
No fim da Gran Via, está a plaza de España, com alguns dos edifícios mais altos desta parte de Madrid e com um parque simpático e suficientemente grande para acomodar algumas centenas de pessoas durante os dias de calor, com o seu monumento ao D. Quixote (ah pois é!).
Atravesso o parque e desvio-me do percurso do metro em direcção à calle de Ferraz e não à calle Princesa. Atrás de mim está o Palácio Real e à minha esquerda fica agora um enorme parque com com vista para a Casa de Campo (que é igualmente um enorme parque que limita a Oeste a cidade), e o templo de Debod, um templo egipcio que foi oferecido pelo governo deste país para agradecer os financiamentos espanhois aquando do corte de investimento americano na barragem do Assuão, devido ao envolvimento do Egipto na guerra dos seis dias. "Toma lá dinheiro para uma barragem! Obrigado, aqui tens um templo!" Que raro, como se diz por aqui. Continuo mais um pouco pela Ferraz, que está cheia de edifícios que revelam que estamos numa zona cara da cidade. Mas como tem pouco que se veja, rapidamente tento seguir pela paralela à sua esquerda, o Paseo del Pintor Rosales. Não sei quem é este pintor Rosales, mas o seu paseo tem uma vista muito agradável para a Casa de Campo. Aqui encontra-se o teleférico que liga a cidade a um sítio no meio da Casa de Campo (que ainda não tive oportunidade de conhecer). Acho que se tivesse "bueda guito", era aqui que morava... O paseo del Pintor Rosales extende-se por uma grande distância, até que faz esquina com o Paseo de Moret, paralela à pequena, mas muito agradável calle de Lisboa).
O paseo de Moret está cheio de árvores imagino que seja muito fresco e agradável de verão, e chega ao final da linha 3, Moncloa (onde imagino que esteja o parlamento), que não conseguir ver. Estamos agora a voltar para trás, ou seja, a seguir a linha 3 do início de volta à plaza de España. Logo no início da calle Pricesa, está o Cuartel General del Ejército del Aire, onde está muito visível um agradecimento na fachada do edifício... ao General Franco! Esta é uma fas grandes diferenças que se faz sentir entre Portugal e Espanha: é que para o bem e para o mal, os espanhois não tiveram uma revolução que restabelecesse a democracia. Foi uma passagem "controlada", mas que fez com que determinadas coisas que para mim são chocantes aqui se passem com naturalidade. Imaginem o que seria um agradecimento num edifício público ao Presidente do Conselho Salazar? A mim não me faria rir.
Continuando pela calle Princesa, chegamos à estação de Argüelles, de onde parte a linha 4 do metro, a próxima a explorar. Seguimos e passmos pela estação Ventura Rodríguez, que estava fechada quando cheguei a Madrid, mas entretanto já abriu. A partir de aqui, nada de grande interesse até chegar novamente à plaza de España. No número 1 da calle princesa está a sala Heineken (tinha outro nome até há pouco tempo, mas vender nomes de recintos de espectáculos parece que está na moda e dá dinheiro). E aqui estamos novamente na plaza de España. De assinalar que aqui nesta zona estão 4 dos cinemas que eu frequento. Sou habitué da plaza de España!
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